Ao final da revolução
industrial, a Inglaterra já estava com seus rios poluídos e com as fontes de
água contaminadas. Esses fatores e mais a epidemia de cólera de 1848 trouxeram
uma nova preocupação para a sociedade naquele momento: como poderiam tratar
seus esgotos?
Foi nesse cenário que
surgiu o médico John Snow, considerado o pai da epidemiologia moderna. Ele provou em
1854 a relação entre doenças como a cólera e a qualidade das águas. Em função
de suas ideias, a partir de 1882 os ingleses começaram a investigar os
fundamentos biológicos para tratamento dos esgotos com a introdução forçada de
ar. Esses experimentos se apresentaram eficientes na remoção da matéria orgânica.
Em 1914, em Manchester, Arden e Lockett retomaram esses estudos e testaram o uso repetitivo dos
sólidos floculados no tratamento dos esgotos aerados. Resultado: descobriram
como aumentar a tratabilidade dos esgotos e essa melhoria na eficiência da remoção
da matéria orgânica fez com que os sólidos floculados fossem chamados de “lodo
ativado” (ARDEN; LOCKETT, 1915 apud PICKBRENbateladaNER, 2002).
Assim
foi criado o sistema de lodo ativado de fluxo intermitente, também conhecido
como reator sequencial em bateladas. Naquela época, Arden e Lockett denominaram
esse processo de tratamento de “Fill and Draw”,
ou seja, “encher e descartar”, onde parte do lodo gerado anteriormente seria
utilizada para tratamento da próxima batelada.
Esse sistema gerava um
efluente claro, sem odor e de excelente qualidade. Ocorre que, as limitações
técnicas da época e a necessidade de elevada mão de obra para sua operação, fez
com que ele ficasse esquecido por um bom tempo. Só nas últimas décadas, foi
que o reator sequencial em bateladas (RSB) pode se tornar uma boa alternativa
devido a evolução tecnológica que lhe trouxe facilidade de instalação e
operação. Porém, enquanto isso não ocorria, as dificuldades existentes na época
de sua criação fizeram com que o processo fosse se adaptando até resultar no
“sistema de fluxo contínuo” que se conhece hoje.
Basicamente, o fluxo contínuo se constitui de um reator-aerador e um decantador-clarificador para
separação das fases, retirada do lodo excedente e retorno contínuo do lodo
ativado para a entrada do reator.
O sistema permaneceu
recebendo melhorias depois dos anos 1950, época de grandes pesquisas e
desenvolvimento tecnológico. Foi quando surgiram importantes estudos cinéticos
de crescimento microbiano, cálculos de dimensionamento de estações de tratamento
de efluentes, metodologias de projeto e novos equipamentos como aeradores,
bombas, medidores, etc. Tal desenvolvimento culminou com a popularização
do tratamento aeróbio de lodo ativado pelo sistema de fluxo contínuo a partir
dos anos 1970, tornando-o a mais importante tecnologia de tratamento de esgotos
e efluentes industriais no mundo.
Nesse
período, o sistema lodo ativado já superava de longe outros tipos de tratamento
de efluentes, como as lagoas facultativas e as lagoas aeradas que demandavam
maiores áreas de construção, eram passíveis de maiores riscos ambientais e
tinham menor eficiência na remoção da mateira orgânica.
Mais pesquisas continuaram trazendo inovação ao processo de lodo ativado. Dessa
forma, novas tecnologias, como a aeração prolongada, o sistema Attisholz, o
MBBR (Moving Bed Biofilm Reactor)
e o MBR (Membrane Bio Reactor) foram se integrando ao processo para melhorar
cada vez mais a eficiência do tratamento.
Tudo
isso começou a mais de 170 anos, em um momento, de certa forma, parecido com
este em que estamos vivendo. Épocas de crise, de epidemia e pandemia. Épocas
que exigem mudanças, superação e inovação. Mas a história não para aí!
Novas
demandas do setor permanecem alimentando o espírito inovador. Seja por
questões sociais, de saúde ou mesmo de ordem econômica relacionada ao
processo de lodo ativado, sempre haverá novidades na mídia
especializada. Assim, melhorias relacionadas a detecção e tratamento de poluentes
orgânicos persistentes (POPs), medicamentos e drogas no tratamento terciário, o
avanço da biotecnologia para redução de descarte de lodo orgânico e o
surgimento de novos equipamentos são apenas alguns dos sinais da dinâmica
evolutiva inserida no processo de lodo ativado.
Autor:
José
Leonardo da Silva Cardoso
Gestor
Ambiental e Diretor Técnico da Biotrakti
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