Muito se tem noticiado e
comentado sobre os problemas causados pela ação humana no meio ambiente. E
dentre uma infinidade de situações impactantes nesse universo, a mídia nacional
abriu o ano novo com um velho e conhecido tema ambiental: a qualidade da água
que chega nas nossas torneiras.
A perda do padrão de potabilidade
da água servida a população fluminense não é caso isolado. Entre as várias
causas, temos a eutrofização dos mananciais que provoca a proliferação de
algas. O resultado é a ineficiência do tratamento e aumento de custos no
fornecimento de água potável.
O florescimento de algas e cianobactérias
nos mananciais brasileiros não é novidade. Em meados dos anos 1990, a represa
de Guarapiranga, localizada na região sul de São Paulo, já apresentava esse problema que passou a
preocupar o governo do estado. Tanto que, em 2009, a SABESP fechou um contrato
com a UFSCAR para prever a sistemática de aparecimento de algas naquela represa.
Em 2014, uma aglomeração de três quilômetros de algas na Guarapiranga trouxe
nova preocupação em meio a grande crise do abastecimento de água na região.
Florescimento de algas verdes em um corpo d'água |
Mas porque a proliferação das
algas e cianobactérias é tão recorrente nos ecossistemas aquáticos?
A intensificação da atividade
humana e as alterações climáticas vêm causando a eutrofização dos lagos,
represas e rios do todo o planeta. A eutrofização é um processo de
enriquecimento anormal das águas, causada por excesso de material orgânico e
nutrientes como nitrogênio e fósforo oriundos, principalmente, de descargas
irregulares de efluentes industriais e esgoto doméstico. A destruição da mata
ciliar dos mananciais, carreamento de fertilizantes residuais da agricultura e
poluição atmosférica também causam a eutrofização. Até mesmo a chuva pode ser
fonte de fosfato e de nitrogênio. Portanto, os grandes mananciais das regiões
urbanas estão sujeitos a ter uma carga adicional de poluição em suas águas. Isso ocorre porque as chuvas trazem de volta a
poluição atmosférica gerada pelo intenso tráfego de veículos.
A eutrofização normalmente ocorre
em águas superficiais com longos períodos de retenção, como represas e lagos.
Porém, acontecem intensos descartes de efluentes e esgotos sem nenhum
tratamento nos rios brasileiros. Este fato tem contribuído muito para o
crescimento dos fitoplanctons e aumento da biomassa de algas e cianobactérias
em suas águas.
Mais uma vez nos deparamos com a
principal causa dos problemas ambientais: a falta de saneamento básico. O país
trata apenas 46% do esgoto gerado, segundo dados mais recentes do Instituto
Trata Brasil. Portanto, mais da metade dos esgotos são lançados no meio
ambiente sem tratamento. No caso do Rio
de Janeiro, apenas 28% dos dejetos são tratados.
Naquele estado, a poluição chega
aos reservatórios do Rio Guandu através de seus afluentes Poços, Ipiranga e
Queimados, que recebem esgoto in natura das cidades da Baixada Fluminense. Daí,
não estará errado quem disser que as estações de tratamento de água da CEDAE
estão tratando esgoto para servir a população. Lembrando que em janeiro (2020),
as torneiras das residências cariocas estavam fornecendo um efluente turvo, com
odor e sabor de terra.
Quais as principais
dificuldades e custos adicionais gerados pela má qualidade das águas utilizadas
para abastecimento público?
As estações de tratamento de água
(ETAs) transformam a água bruta dos mananciais em água potável. O tipo de
tratamento adotado para cada ETA depende diretamente da qualidade da água do
manancial que a abastece. Dessa forma, uma água bruta pouco poluída será
facilmente tratada resultando em água potável de ótima qualidade a custo baixo.
Porém, se a água do manancial for muito poluída, serão necessárias etapas
adicionais ao processo de tratamento, maior diversidade e maior quantidade de
produtos químicos e mais mão de obra especializada para se obter uma água
tratada de qualidade satisfatória para o consumo humano. Além do exorbitante
aumento de custos com os produtos químicos, haverá também necessidade de
investimentos físicos na ETA e despesas extras com a disposição da maior
quantidade de lodo gerado durante o tratamento.
Para se ter uma ideia das
dificuldades que o excesso de poluentes na água bruta causa aos sistemas de
tratamento, apresentamos alguns de seus efeitos na operação das estações que
captam água ‘eutrofizada’: - maior utilização de alcalinizantes e coagulantes;
necessidade de adicionar polímeros para auxiliar na floculação e evitar arraste
dos flocos leves; perda da eficiência na decantação e remoção dos flocos; maior
consumo de água para limpeza dos
sistemas filtrantes obstruídos; maior consumo de cloro para combater a
matéria orgânica e a amônia - isso aumenta a possibilidade de formar
organoclorados que são nocivos à saúde da população; baixa qualidade da água tratada
devido problemas de odor, sabor e turbidez e aumento de depósitos de ferro e
manganês nas tubulações causando problemas operacionais.
Todas os fatores citados fazem
aumentar os custos de tratamento da água. Além de que, o processo irá exigir um
monitoramento mais dedicado do sistema de abastecimento, aplicação de algicidas
no manancial e tratamentos específicos para remoção de ferro e manganês. A
propósito, veja mais detalhes no estudo “Algas e seus Impactos em
Sistemas de Tratamento de Águas para Abastecimento: Estudo de Caso Sistema
Guarapiranga”.
Como já foi dito, o florescimento
de algas e cianobactérias nos mananciais brasileiros não é novidade. Se o
problema não for atacado com planejamento e seriedade, sua reincidência será
sempre mais abrangente e progressivamente prejudicial. De nada servirão os
caríssimos e ineficientes tratamentos emergenciais que são utilizados no curto
prazo para minimizar os danos. De acordo
com especialistas do setor, é imperativo que haja investimentos efetivos para
imediata elevação dos índices de coleta e tratamento do esgoto doméstico nas
áreas problemáticas. Outra ação
importante é intensificar os trabalhos de educação ambiental para reduzir o
descarte de lixo e esgoto in natura em nossos rios, lagos e represas.
Autor:
José
Leonardo da Silva Cardoso
Gestor
Ambiental e Diretor Técnico da Biotrakti
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