Comentários Revisitados
Um “rant” pessoal e raivoso de um velho hippie com atuação técnico ambientalista
Este velho rabugento está com
mais raiva ainda. Está em progresso um processo de atualização do Marco Legal do Saneamento Básico Lei 11.445/2007. As falhas na política atual
são evidentes e bem explicitadas num artigo publicado na Folha de São Paulo, no
dia 4 de junho de 2018 (sem-nova-lei-gigantes-do-saneamento-veem-investimentos-restritos):
Aqui cito somente um exemplo do descaso generalizado: “Dados do IBGE mostram
que, em 2018, 66% dos domicílios do país tinham acesso a rede geral ou ligada à
rede para escoamento de esgoto”.
Segue em adição, um resumo de alguns acontecimentos recentes.
Segue em adição, um resumo de alguns acontecimentos recentes.
1. ATUALIZAÇÃO
1.1.
No final do governo Temer, foi editada a Medida
Provisória 868/2018, que em 2019 caducou por não ser formalizada em lei pelo
congresso nacional a tempo.
1.2.
O projeto que atualiza o Marco
Legal do Saneamento Básico (PL 3.261/2019) foi apresentado pelo Senador Tasso
Jereissati (PSDB-CE), O Senado aprovou com urgência o projeto que retoma
a essência do MP do saneamento básico e transformou no projeto de lei. Este
projeto já foi aprovado com urgência pelo Senado e enviado ao Câmara
dos Deputados.
1.3.
Perdido na Câmara dos Deputados Federal: A
situação atual da MP original é bem apresentada numa referência encontrada no
site chamada Ecodebate, (PL que institui
novo marco legal para saneamento básico no país chega à Câmara dos Deputados
sob críticas de todos os lados). Atualmente, segundo o site
Ecodebate: “o projeto de lei ainda aguardava distribuição para as comissões
temáticas”.
1.4.
A falta de investimentos em saneamento básico é,
também, bem explicitada na referência da Folha de S.P. inicialmente citada
acima. Também, as razões desta insuficiência não são difíceis de levantar-se,
iniciando com as falhas no próprio Marco Legal do Saneamento Básico Lei
11.445/2007 original. Porém, vale destacar que a falta de saneamento básico no
Brasil, vem de longa data e, acho que posso dizer que, é intrínseca ao
subdesenvolvimento do país.
1.5.
O novo projeto do Senador Tasso Jereissati pretende
flexibilizar a contratação das obras e a operação dos sistemas de saneamento
básico. O projeto permitirá uma maior concorrência na contração dos projetos pela
estados e municípios com as empresas estudais e privadas. Também permite e até
incentiva, a formação de projetos e sistemas multi-municipais e por bacia
hidrográfica.
1.6.
Mais Raiva: As razões desta minha raiva
fundamentam-se na simplificação dos argumentos contra as melhorias no novo
Marco Legal proposta e que podem ser resumidas assim:
1.6.1.Nacionalismo e Corporativismo:
só para citar dois exemplos em relação a esses conceitos, pode-se verificar que
são frequentes os comentários pelos opositores às modificações como “O projeto
permitirá a privatização da água”, e o fato que os funcionários da SABESP estão
contra as modificações do Marco Legal.
1.6.2.Tratamento do esgoto: Os
atores principais, incluindo a própria Folha de São Paulo me deixam mais
raivoso. É muito fácil perceber nas reportagens e programas, a simplificação de
que basta ligar canos de esgoto às casas para que se resolva o problema de
saneamento básico. A ignorância, proposital ou não, quanto ao fato de que
existem grandes dificuldades físicas e financeiras para tratar o esgoto coletado
antes de lançado no meio ambiente me deixa ainda com mais raiva.
2.
Pesquisas da Literatura e Referências:
2.1.
Partindo de um estudo realizado por Elisa Meyer,
em Privatization
Of Water Treatment In The U.S., observa-se que a análise sobre a
privatização do serviço de tratamento de água requer muitas ponderações. Se
você também tem dúvidas quanto à melhor opção de tratamento de água, sugiro que
leia o artigo da autora. São apenas três páginas! Mas, novamente, para nosso
próprio benefício - meu e seu caro leitor - vou resumir e comentar os
principais pontos e informações apresentados por Meyer.
A autora
apresenta inicialmente quatro tipos comuns de privatização que são considerados
como opção para o tratamento da água nos EUA:
·
Terceirização de serviços de suporte a serviços
públicos para empresas privadas;
·
As empresas privadas operam e gerenciam obras de
tratamento público;
·
Contratos de projetos de construção e operação;
·
Venda de ativos de água de propriedade do
governo para empresas privadas.
Segundo a
autora, somente na quarta opção, todos os riscos e a responsabilidade são
transferidos para uma empresa privada. Ao analisar as razões para não
privatizar os sistemas de tratamento de águas, Meyer aponta os seguintes
motivos:
Ø
Redução
da responsabilidade pública: as empresas privadas podem ser tão
"lucrativas" que não agem no melhor interesse do público;
Ø
Impacto
para famílias de baixa renda: a incapacidade de pagar serviços de água e a
falta de envolvimento do governo podem afetar as famílias de baixa renda;
Ø
Taxas
mais elevadas: os dados de países e estados que privatizaram o tratamento
da água tendem a apoiar a ideia de que a água privatizada atinge um custo maior
de utilidade para os cidadãos;
Ø
Falta de
preocupação com questões locais: as empresas com capital para investir em
operações de água são muitas vezes nacionais ou internacionais, com interesses
correspondentes. Para a autora as empresas citadas por escândalo na França, são
operadoras mundiais.
Ø
Redução
de benefícios para os trabalhadores: um relatório de 2009, Water
Privatization Threatens Workers, Consumers and Local Economies, publicado pela Food and Water Watch, mostra que os benefícios, a cobertura do
seguro de saúde e a adesão ao sindicato caíram ou foram significativamente
menores nas estações de tratamento de água de manejo privado do que naquelas
executadas publicamente. Esse relatório aponta que essas mudanças afetam a
economia em geral, impactando-nos.
2.2.
Avaliando os cinco itens contra a privatização
apontados por Meyer sinto que tudo pode ser minimizado com o controle e
regulamentação do governo, incluindo uma sistemática auditoria. Aliás, a
própria autora menciona um artigo de Rubenstein (2000), THE UNTAPPED POTENTIAL OF WATER PRIVATIZATION, que avalia que a regulamentação
do governo é sempre necessária, particularmente no que diz respeito ao
tratamento da água.
Em relação às
razões favoráveis a privatização dos sistemas de tratamento de águas, Meyer
aponta os seguintes motivos:
Ø
Eficiência:
os contratantes privados de água são motivados a maximizar a eficiência para
maximizar o lucro, enquanto as operações administradas pelo governo não têm
essa preocupação;
Ø
Segurança
da água: uma vez que as empresas privadas são responsáveis pela segurança e
qualidade da água, elas são motivadas para garantir a segurança;
Ø
Benefícios
financeiros: dependendo do acordo, o pagamento antecipado das empresas que
alugam ativos da cidade pode ser uma excelente fonte de fundos para o governo
reinvestir;
Ø
Redução
dos custos do setor público: a contratação de serviços de água a empresas
privadas reduz a quantidade de salários, benefícios, compensação de
trabalhadores e outras despesas que devem ser pagas para os funcionários
públicos;
Ø
Especialização:
alguns advogados argumentam que os empreiteiros privados trazem empregados mais
especializados e conhecimento para as operações de água do que as operadoras
públicas;
Ø
Menos
burocracia: o governo pode ser lento, burocrático e ineficiente, devido a
regulamentos e à falta de responsabilidade direta. Isso geralmente não é o caso
dos contratados privados.
Essas seis
razões a favor do serviço privatizado para o tratamento de água apontadas
por Meyer podem ser facilmente comparadas com as cinco razões contra a
privatização. A solução para maximizar as seis e minimizar as cinco seria criar
uma organização responsável pela supervisão e regulação de empresas privadas. Gostaria
de acrescentar que esta supervisão deveria ser realizada no nível mais local
possível, incluindo o máximo de contato direto com a população servida. No
entanto, isso me parece longe de ser facilmente alcançado, particularmente no
Brasil.
2.3.
Também, um estudo interessante de Andrea
Kopaskie sobre como os Estados Unidos administram e operacionalizam o seu
sistema de água pode ser encontrado no Blog
de Finanças Ambientais. Este blog tem uma legenda que provoca muitas
reflexões a respeito: "Como você
paga é importante". Segundo o estudo de Kopaskie, mesmo nos EUA, que
valoriza o capitalismo e a privatização dos serviços apenas cerca de 12% da
população nacional é servida por sistemas de tratamento de água com controle
privado. O estudo termina com uma advertência sobre toda a discussão que
realizamos, apontando que: "A eficiência, o custo e as margens de renda
são questões de debate, e é difícil dizer que tipo de opção - pública ou
privada - é necessariamente melhor para a sociedade".
3. CONCLUSÕES
– PESSOAIS
Então, depois de todas essas
reflexões, o que eu penso? Aqui apresento duas conclusões pessoais sobre como e
porque o serviço de tratamento de água, esgoto
e os resíduos sólidos deveriam ou não ser privatizado.
Primeiro eu não me basearia em um
argumento de tipo "nacionalista", ou seja, só porque o controle é estatal
ele é melhor, ou que o controle estatal é uma necessidade.
Segundo eu votaria em FAVOR de
propostas que possam mostrar uma experiência real contínua com resultados de
baixo custo e eficiente, não só operacionalmente, mas também em termos de
retorno social. Eu acredito que tanto o serviço oferecido pelo Estado quanto o
oferecido pela iniciativa privada precisam ser muito bem supervisionados pelos
próprios usuários. Entretanto, a forma desta supervisão depende de
implementação de sistema bem regulamentado pelo governo.
Enfim, acrescentando as reflexões
aqui colocadas, gostaria de enfatizar que o custo da água deve ter um valor
real, sem subsídios. Defendo essa ideia porque ao subsidiar o custo da água
para os menos afortunados, também estaríamos subsidiando a população mais
abastada. Além disso, um custo menor que o valor real da água induz ao
desperdício por parte de todos os usuários. O argumento de que a população de
baixa renda não consegue arcar com o custo da água deve ser resolvida com
melhores salários, ou com programas especiais de complementação de renda
familiar.
É importante deixar claro que acredito
fortemente na redução das desigualdades sociais e econômicas entre os
indivíduos que compõe uma sociedade. Parece-me que o objetivo da sociedade é
promover oportunidades iguais em educação, saúde, moradia, segurança, etc. No
entanto, este não é o lugar para definir o que é "justiça social" e
como ela deve ser alcançada.
Esses são meus sentimentos sobre
o assunto.
Autor: David Charles Meissner
É dono da DCMEvergreen – Environmental
Consulting Services.
Formado em Química na Michigan State
University, East Lansing (Mi USA)
Mestrado em Química Orgânica pelo ITA-CTA,
S.J. dos Campos, SP – Brasil.
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