No Brasil, as costumeiras secas no semiárido, os problemas
de poluição aquática, a baixa vazão dos mananciais das grandes metrópoles e, mais
recentemente, a crise hídrica de São Paulo em 2014, têm nos impulsionado na busca
de alternativas para aproveitamento de águas pluviais e para aplicação de
tecnologias de reúso de águas residuárias que possam reduzir a demanda sobre nossos
recursos hídricos naturais.
Essas questões fazem surgir novos projetos, novas resoluções
e medidas de conservação dos recursos hídricos e de aumento da eficiência do
consumo de água potável. Daí, também começam a ser implantados alguns sistemas
de tratamento e reúso seguro para redução da proporção de águas residuárias não
tratadas e minimização da escassez de água de abastecimento, como veremos mais
adiante.
Essa é a dinâmica que contém em si, a valorização das águas
residuárias. Porém, o jogo está apenas começando e para avançar, precisa de
antemão, da total aceitação social, conforme argumenta a diretora-geral da
UNESCO, Irina Bokova, no Relatório
Mundial sobre o Desenvolvimento dos Recursos Hídricos de 2017: “O
envolvimento dos cidadãos em todos os níveis do processo decisório promove o
comprometimento e a responsabilidade social. Isso inclui decisões sobre quais
tipos de instalações sanitárias são desejáveis e aceitáveis, e sobre como elas
podem ser financiadas e mantidas com segurança no longo prazo”.
Por sua vez, iniciativas de âmbito institucional, de
infraestrutura e financiamento de projetos em prol do reúso começaram a
tramitar pelo Congresso Nacional. O Ministério das Cidades tem planos de criar
uma Política Nacional de Reúso de Água; em dezembro último, a Comissão do Meio
Ambiente da Câmara aprovou a inclusão do reúso da água nos fundamentos da
Política Nacional de Recursos Hídricos - falta análise da Comissão de
Constituição e Justiça (A Voz do Brasil – 26/12/2017). Em São Paulo foi
promulgada a Resolução conjunta SES/SMA/SSRH nº 01/2017 sobre reúso direto não
potável de água, para fins urbanos, proveniente de ETE, porém sob critérios
restritos demais, que por enquanto, inviabilizam o reúso.
A Confederação
Nacional das Indústrias (CNI) também contribuiu apresentando propostas de
alteração da Lei Federal de Saneamento Básico, com o intuito de incentivar o
investimento na construção de plantas que tratem os esgotos para produção de
água de reúso de qualidade, periodicidade e preço compatíveis com a demanda.
Veja isso e muito mais em Juntos
pela Água.
O governo federal está concluindo o Programa Interáguas, que
desenvolve estudo para ampliar o reúso de efluentes sanitários, principalmente
para os setores industrial e agrícola. A meta é elevar de 2 para 10 m³/s a
produção de água de reúso até 2030.
Em todo o país, já existem diferentes projetos de reúso de
efluente sanitário em funcionamento. Muitas ETEs reutilizam seu efluente
tratado e desinfetado para serviços operacionais, como por exemplo, a ETE
Dancing Days, no Recife, que o utiliza para desobstruir as redes de esgoto. Como
projeto de reúso indireto, temos a construção de uma captação de água do Lago
Paranoá, em Brasília, para produção de água de abastecimento humano para uso
interno na Caesb. A própria Caesb opera duas ETEs que descartam seus efluentes
tratados no referido lago.
Devemos destacar também, o maior projeto de água de reúso do
hemisfério Sul. Trata-se do Aquapolo, que foi criado para abastecer o Polo
Petroquímico de Capuava, em Mauá-SP e outras empresas da região do ABC
paulista. O projeto deu muito certo e, além de aumentar a oferta de água
potável para a região metropolitana de São Paulo, também se tornou uma solução
economicamente viável para as indústrias envolvidas, que deixaram de usar
mensalmente 900 milhões de litros de água potável, baixando pela metade os
gastos com esse insumo. A todo esse sucesso do projeto, ainda devemos
acrescentar a significativa redução do passivo ambiental que deixa de ir para o
corpo hídrico. O projeto Aquapolo continua crescendo e atraindo outras grandes
indústrias da região. Veja mais detalhes em REÚSO
DE ÁGUA GANHA ESPAÇO PARA CRESCER NO BRASIL.
Como
já dito anteriormente, a valorização das águas residuárias é um jogo que está
apenas começando em nosso país, porém, que já apresenta resultados muito
interessantes. O Brasil começou a ampliar suas estratégias para resolver os problemas
de saneamento e de gestão dos recursos hídricos, apoiado pelo avanço das
pesquisas e pelo desenvolvimento de tecnologias para tratamento avançado e de
reúso das águas residuárias. Mas para alavancar as inúmeras iniciativas que estão
ainda por vir, é necessário que haja também uma maior conscientização e
envolvimento dos cidadãos.
Daí
a necessidade de uma melhor educação ambiental e de ampla aceitação social dos
projetos de reúso das águas residuárias. Aqui cabe reproduzir uma observação
feita por nosso amigo e colaborador desta coluna, David C. Meissner, durante
sua participação no 256th American Chemical Society National Meeting,
que ocorreu em Boston na semana passada: David relata que para melhorar a
aceitação da ideia de usar ou reusar o esgoto tratado, os americanos estão
mudando o foco para os recursos de recuperação, sem mencionar águas residuais
ou esgoto. Assim as Estações de Tratamento de Efluentes passam a ser
Instalações de Recuperação de Recursos Hídricos.
É
muito importante que se perceba que a água residual despejada no meio ambiente
está deixando de ser um problema caro e difícil de lidar para se tornar um
valioso recurso hídrico complementar. Essa mudança de paradigma precisa
envolver toda a sociedade brasileira, desde o cidadão comum até os altos
escalões do governo, para que as metas ambientais possam ser alcançadas o mais
breve possível e para que o país tenha sustentabilidade para continuar
crescendo.
Autor: José Leonardo Cardoso
Diretor
Técnico da Biotrakti
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