Faremos hoje uma breve abordagem
da questão do esgotamento sanitário no Brasil. Assunto que merece especial
atenção por fazer parte do saneamento básico deste país que traz desde suas
raízes, extenso histórico de mazelas contra seu povo, em todos os aspectos,
incluindo os de cunho ambiental e de saúde pública. Esse tema começou a tomar
importância no país durante o processo de urbanização ao longo do século XX, quando
as políticas adotadas em prol do mercado imobiliário criaram multidões de
excluídos que foram empurradas para os morros e barrocas de cidades e capitais como
Porto Alegre, Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Belém, Manaus e
outras tantas.
Desde então, grande parte dessa
periferia tem sobrevivido sem os benefícios do esgotamento sanitário, ou seja,
sem qualquer sistema de coleta ou tratamento de esgotos. Sem as redes
coletoras, estações elevatórias e de tratamento, todo o esgoto produzido nas
periferias flui a céu aberto em pequenos rios e córregos que se transformam em
valetas fétidas e contaminadas.
Para se ter uma noção mais ampla
da situação, a figura acima mostra como estávamos no ranking, no momento da
virada do século, em comparação com os principais países das américas e Caribe.
A cobertura da população total com esse serviço variou de 0% no Haiti a 76,8%
nos Estados Unidos. Entre os países indicados, apenas Colômbia, Estados Unidos
e Chile passaram da cobertura de 60% da população. O Brasil vinha bem atrás.
Outra agravante para a situação geral era o baixo nível de tratamento das águas
residuárias coletadas que não passava de 10%. – Veja mais em POLÍTICA
E PLANO MUNICIPAL DE SANEAMENTO AMBIENTAL, do Ministério das Cidades.
Devido as políticas equivocadas, até
então adotadas pelas instituições governamentais e empresariais, as ações de saneamento
básico não foram suficientes para atender a todos com o seu propósito maior,
que é o de promover a saúde pública. Conforme escreve a professora Ermínia
Maricato em seu artigo “Urbanismo
na Periferia do Mundo Globalizado – metrópoles brasileiras”: logo que o crescimento
econômico desacelera e chega a recessão dos anos 1980/90 – quando as taxas de
crescimento demográfico superam as do crescimento do PIB – vem um forte impacto
social e ambiental que amplia o universo de desigualdade social. Surgem daí as zonas
não alcançadas pelo planejamento urbano, com seus dramas maiores, a exemplo da
falta de esgotamento sanitário e o consequente impacto na saúde pública.
Esse “consequente impacto na
saúde pública” ou outro qualquer como o aumento da violência por exemplo, é
aquilo que os economistas chamam de “custos de oportunidade”, que nada mais são
que as consequências do abandono das demais oportunidades que deveriam ser
contempladas. No caso do saneamento básico, ou mais especificamente, do
esgotamento sanitário, que é o tema em pauta, os governos do século XX optaram
pelo planejamento urbano para os ricos, sem priorizar o social. Daí o nó veio
arrebentar principalmente na saúde, que é fortemente afetada pelas doenças de veiculação
hídrica.

Apenas em 2015 - informa o
Instituto Trata Brasil - nossa população alcançou os 50,3% de acesso à coleta
de esgoto e, do coletado, apenas 42% desse efluente recebeu algum tipo de
tratamento antes de seu descarte no meio ambiente; ou seja, quase nada mudou!
Portanto é possível prever os resultados para os próximos anos.
Outro fato a ser considerado é a
privatização de nossas águas. Também denominado concessão do saneamento básico,
esse processo se iniciou em 1990 e vem se intensificando até chegar aos dias
atuais. Ocorre que se a universalização dos serviços perderem em prioridade
para o lucro das empresas privadas, se a gestão não for eficiente e não houver
uma fiscalização moderna e justa, poderemos estar fadados ao fracasso, a
exemplo de alguns países que já sentiram os impactos negativos desse tipo de política
ambiental. Para ilustrar vamos lembrar da “Guerra da Água” que causou a morte
de mais de 70 pessoas em Cochabamba no ano de 2000, numa clara revolta contra
as altas tarifas cobradas pela empresa americana Bechtel na época.
Todos nós devemos saber que os
resultados sociais dependem diretamente da seriedade dos contratos feitos entre
nossos governos e as empresas privadas do setor. Atualmente são 17 milhões de
brasileiros atendidos em 12 estados pela canadense Bookfield, que adquiriu o
negócio da Odebrecht Ambiental numa transação de quase 3 bilhões de reais.
Muitas outras empresas estão de prontidão para também terem sua fatia de
mercado aqui no Brasil e o BNDES está preparando uma fila de 18 estados para
entrarem em negociação, conforme informa o cientista social Dr. Flávio José
Rocha da Silva em artigo publicado no site do Fórum Mundial Alternativo das
Águas.
Então!? Como universalizar a mais
defasada questão do nosso saneamento básico? Como resolver essa grande e
histórica dívida social? Como fazer os projetos socioambientais evoluírem? Onde
estará a resposta? - Estará na criação e implementação de projetos modernos e
eficientes, geridos e fiscalizados sem indícios de corrupção pelas nossas
entidades governamentais? Estará na participação mais efetiva da sociedade civil
com suas ONGs
ambientais gerando novas estratégias para melhoria da qualidade de vida e
acompanhamento das atividades dos órgãos competentes nas questões ambientais?
Certamente! Será
necessária muita seriedade de todos para que o Brasil funcione como precisa.
Serão necessárias políticas públicas coerentes com as metas ambientais para que
o país possa desfrutar da expansão do saneamento num futuro próximo. E olha que
com apenas 50,3% de acesso à coleta de esgoto, há muito o que se fazer para
chegar lá!
Autor: José Leonardo Cardoso
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