segunda-feira, 31 de agosto de 2020

Problemas de Salinidade no Tratamento Biológico de Efluentes

 Um dos pilares fundamentais do tratamento biológico é a sedimentação.  Por isso seu desempenho depende muito da qualidade da estrutura do lodo formado. Entretanto, o processo de tratamento - mais especificamente, referente ao sistema de lodo ativado - está sujeito a uma infinidade de fatores que podem causar instabilidade na formação e agregação dos flocos bacterianos e prejudicar o processo de tratamento de alguma forma.

Um desses fatores que impactam de maneira significativa e que tem sido pesquisado há um bom tempo é a salinidade dos efluentes que pode interferir na floculação e reduzir a eficiência da sedimentação e do desaguamento do lodo.


Os flocos do lodo ativado normalmente são interligados por pontes formadas por substâncias poliméricas extracelulares (SPE) produzidas pelas próprias células bacterianas. SPONZA (2003) apud (Deorsola, 2006) verificou que o desempenho do processo biológico depende das características dos flocos, da composição das SPE, em termos de proteínas e polissacarídeos, e que essas características variam conforme a composição do efluente. Ou seja, tais características variam conforme a salinidade do efluente.

A salinidade existente no efluente, representada principalmente pelos cátions sódio, potássio, cálcio e magnésio, exerce grande influência no processo de formação e sedimentação dos flocos. Esses cátions podem tanto atuar no interior do floco, quanto na formação de pontes entre as extremidades negativas dos biopolímeros extracelulares. E sua influência pode ser positiva ou negativa.  Vai depender muito da concentração e do tipo de cátion.

(Novak, 2001) sugere que cátions monovalentes reduzem as forças de ligação, levando ao afrouxamento da estrutura, frequentemente diminuindo a densidade do floco e a resistência ao cisalhamento. Isto impacta negativamente na sedimentação, aumentando a turbidez do efluente tratado. A maior quantidade de partículas pequenas no sobrenadante também aumenta a resistência a filtração, resultando em perda de eficiência do desaguamento do lodo descartado.

Quanto aos cátions bivalentes, sugere que estes participam na formação de pontes entre as extremidades negativas dos biopolímeros, promovendo crescimento do floco, maior densidade e resistência ao cisalhamento. Todas essas condições resultam em melhor sedimentação da biomassa.

Os pesquisadores observaram também que a razão monovalente-divalente (M/D) e a concentração de cátions exercem grande influência nas propriedades de sedimentação e desaguamento dos lodos ativados. Esse é um ponto muito importante no estudo da influência dos cátions. Mais especificamente para o sódio e cálcio - a razão M/D maior que 2 implica na deterioração das propriedades de desaguamento.

Outro fator a ser considerado é a variação da salinidade no efluente. De certa forma, se não houver muita oscilação do ambiente iônico, as bactérias e os SPEs conseguem se aclimatar e formar flocos num nível mais alto de condutividade.

(Santos, 2012) utilizou a análise biológica do lodo e a taxa de consumo de oxigênio para avaliar a influência da salinidade nos processos de lodo ativado. Os resultados apontaram para a deterioração da atividade metabólica dos micro-organismos consumidores de oxigênio dissolvido, nas concentrações a partir de 15 g/L de NaCl. Foram confirmados que os protozoários existentes em condições normais de operação, não sobreviveram nas condições de estresse osmótico, dando lugar a novas espécies que estão relacionadas com a baixa qualidade biológica. O grupo de protozoários que normalmente acompanham a população de bactérias em suspensão, foram os primeiros a desaparecerem do sistema, nas concentrações a partir de 5 g/L de NaCl, sugerindo aumento de turbidez no efluente final.


(Santos, 2012).

 Segue, apresentação de uma situação de persistente instabilidade encontrada na ETE de uma fábrica de celulose e papel que pode estar bastante relacionada com problemas de salinidade. 

Nesta, o lodo biológico se constituía de flocos de baixa densidade e pulverizados, que produziam um efluente tratado turvo. A sedimentação não melhorava nem com a dosagem de polímero nos clarificadores. O desaguamento também estava prejudicado devido a má qualidade do lodo excedente.

Foram feitas amostragens dos reatores para as análises de rotina (tabela 1) e para análises extras das mesmas amostras (tabela 2). As análises extras foram realizadas em absorção atômica de chama para determinação da concentração dos cátions Na, K, Ca e Mg.





Foi constatado que a razão M/D estava alta e que o sódio era o causador daquela demanda. Entretanto, por ser um dos pivôs do processo fabril, o sódio não poderia ser evitado.  Para minimizar os impactos, ou mesmo evitar grandes variações na condutividade, algumas ações pontuais poderiam auxiliar, tais como evitar excessos e derramamentos nas áreas, monitorar picos salinos e fazer desvios para lagoa de contenção quando necessário. Outra contribuição positiva, para baixar a relação dos cátions mono-bivalentes no efluente, seria a substituição da soda cáustica pela cal no ajuste do pH afluente. Porém essa substituição aumentaria a tendência de incrustação nos equipamentos.

Atualmente, a empresa faz um controle melhor da salinidade de seu efluente pelo monitoramento da condutividade. Dessa forma, conseguiu aclimatar, de maneira satisfatória, seu tratamento biológico para suportar a toxicidade e as cargas poluentes existentes no efluente com até 5.000 µS/cm de condutividade. E ainda mais importante, consegue reduzir as variações significativas da condutividade no efluente bruto.

 

José Leonardo da Silva Cardoso

Diretor Técnico da Biotrakti

WhatsApp +55 12 98230-1037


Nenhum comentário:

A BIOTRAKTI é uma empresa paulista, situada no Vale do Paraíba, que atua em todo o Brasil, no segmento de engenharia, projetos, consultoria, e serviços de tratamento de água, efluentes industriais e resíduos sólidos em geral.

A BIOTRAKTI está capacitada para criar soluções de engenharia, de meio ambiente e operacionais, em atendimento às metas ambientais de sua empresa.