quinta-feira, 29 de março de 2018

Resumo do Histórico Ambiental de Jacareí



Estamos em Jacareí, o primeiro grande núcleo urbano situado as margens do Rio Paraíba do Sul, que corre ao longo do vale formado entre as Serras do Mar e da Mantiqueira, no estado de São Paulo. Está se aproximando o aniversário da cidade. São 366 anos de história, momento propício para refletir sobre sua beleza, sua cultura, seu acolhimento, seu desenvolvimento socioeconômico e os correspondentes impactos ambientais, matéria que mais nos interessa neste blog. E é dentro dessa ótica, que segue um resumo histórico que abarca desde a origem da cidade até os dias atuais. Confira!

De uma localidade em cujo mapa inicial podemos apenas tracejar as curvas do Rio Paraíba do Sul, alguns de seus afluentes e as trilhas indígenas que ligavam as terras de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, surge um ponto de parada para os viajantes descansarem. Em 24 de novembro de 1653, essa paragem se torna a Vila de N. S. da Conceição da Paraíba, atual Jacareí, a terceira cidade do Vale a se formar e a décima terceira da Capitania de São Paulo, conforme registra Benedicto Sérgio Lencioni em seu livro “Jacareí – Sua História”.

A vila começa a crescer e antes de finalizar o século XVII, já temos uma interessante situação de cunho ambiental. O barranco da margem direita do Rio Paraíba que passava atrás da Igreja da Matriz começa a ser corroído pelas águas. Trata-se de um fenômeno natural típico de rios de planície, mas os moradores amedrontados, recorrem ao padre que, para acalmá-los, realiza um ato religioso com uma imagem de barro da santa padroeira na beira do barranco. No final do ato, a imagem é jogada no rio e afunda sendo levada pela correnteza. Só para constar, em 1717, próximo a Guaratinguetá, alguns pescadores encontram uma imagem com ela parecida... mais aí, já é outra história.

Bem mais à frente, ainda com menos de 10.000 habitantes, mas depois que já era grande produtora de café por mais de uma década, em 03 de abril de 1849, a vila é elevada à categoria de cidade. A seguir, em 1850, Jacareí é tomada por uma grande enchente e esse fato estimula os moradores a fazer um desvio no curso do rio.  Assim, o trecho do rio que avançava em direção a igreja se torna uma área vazia e baixa, que passa a ser conhecida como “Esmaga Sapo”. Depois a região é aterrada e ocupada, resultando na atual Praça dos Três Poderes, famoso cartão postal da cidade.

É nessa segunda metade do século XIX, que surgem a primeira ponte (de madeira – 1858/1876) e a segunda (de ferro, que substitui a primeira) que atende a cidade até 1930. Atualmente, existem 7 pontes em nosso município; duas na zona urbana, duas em São Silvestre, uma no Bom Jesus, outra na Rodovia Dutra, próximo ao Distrito do Meia Lua e uma na Rodovia Carvalho Pinto. Para desafogar o trânsito na área central da cidade, será construída a 3ª ponte urbana, que deverá ser entregue até 2020.

Ainda no final do século XIX, começam a se intensificar os problemas decorrentes da urbanização da cidade. Os produtores de café migram para o oeste paulista, deixando para trás uma região com o solo esgotado. Nessa época, Jacareí, assim como todo o Vale do Paraíba, sente forte impacto econômico devido a decadência de sua agricultura e comércio.

Em 1893, a cidade reage positivamente. É quando Lamartine Delamare cria o Colégio Nogueira da Gama e injeta nova onda de progresso na cidade, revitalizando o comércio e desenvolvendo as indústrias locais. Nessa fase, com a cidade alcançando a contagem de 15.000 habitantes, surge a famosa Fábrica de Biscoitos de Jacareí, que leva o nome da cidade para todo o país, através das vendas feitas na estação ferroviária.

Logo, Jacareí se torna a primeira cidade do Vale a ter iluminação elétrica nas vias públicas. Em 1895, é criada a Cia. Luz Elétrica Jacareiense. Em 1910 passa a funcionar a usina hidroelétrica. Depois o controle do sistema passa para a Cia de Luz e Força Jacareí-Guararema, depois para a Light – Força e Luz, desta para a Eletropaulo até chegar na atual Companhia Bandeirante.

Voltando ao Colégio Nogueira da Gama. Para que o leitor perceba melhor sua importância para nossa história, é bom que saiba que, em 1907 é implantado nesse colégio o primeiro sistema de água encanada da cidade. O Colégio também traz destaque para Jacareí, que fica conhecida como a Atenas Paulista, devido à presença de intelectuais famosos que melhoraram o pensamento e a atitude da comunidade local.

Seguindo a ordem cronológica, vamos acrescentar que o livro ‘A História da Imprensa em Jacareí” de Benedicto S. Lencioni, traz que o jornal “O Município” de 15 de março de 1914 registra o primeiro aviso público referente as práticas de acondicionamento de lixo e das águas servidas para posterior remoção. Nessa época, as residências ainda não têm pias nem abastecimento interno de água ou banheiro -  estes são feitos nos quintais junto com uma fossa. Mais tarde, a importação de tubulações e acessórios da Europa possibilita a chegada da água encanada. Em meados do século XX, os melhoramentos nos serviços básicos de saneamento já atendem grande parte das residências. O crescimento urbano não para, até que em 1976 é criado o SAAE para resolver os problemas de falta de água no município. O SAAE continua conosco, atuante, se modernizando com novas tecnologias e prestando seus serviços com dedicação.

O jornal “A Liberdade” de 7 de fevereiro de 1920 informa outra nova preocupação de caráter ambiental. Refere-se ao impacto nas matas do entorno da cidade, causado pela exportação de lenha e pelo seu uso tanto doméstico quanto para alimentação das marias-fumaças da Central do Brasil, que por aqui transitavam desde 1876, substituindo o transporte de mulas para escoar a produção de café da região.

A urbanização se acelera com o crescimento da indústria têxtil, depois da inauguração da Rodovia Rio-São Paulo em 1926 e se intensifica após a inauguração da Rodovia Presidente Dutra em 1951 – conforme se vê em “Paraíba do Sul - História de um Rio Sobrevivente” de Luís Patriani e Valdemir Cunha. Em 1949, Jacareí inicia a extração e comercialização sistemática de areia do leito do Rio Paraíba. Em 1950, sua população já passa dos 27.000 e cresce continuamente até a década de 1990, em função das migrações nacionais, devido ao grande êxodo rural desse período. Muitas indústrias ocupam as proximidades da Rodovia Presidente Dutra, a exemplo do Grupo Simão que em 1958 instala uma fábrica de celulose sulfato de eucalipto integrada a uma fábrica de papel em Jacareí. Nesse momento, o Brasil ainda importa quase toda a sua demanda interna de celulose (A Evolução Tecnológica do Setor de Celulose e Papel no Brasil, de Edison S. Campos e Celso Foelkel).

A princípio, o resíduo líquido resultante do processamento de celulose é descartado no rio. Os moradores mais antigos ainda se lembram da enorme quantidade de espuma que muitas vezes ultrapassava o piso da ponte N.S. da Conceição no início dos anos 1970. No final dessa mesma década, o problema é solucionado, quando a fábrica investe em tecnologias de recuperação da lixívia. Além de minimizar os impactos ambientais que causava, isso resulta em grande economia no seu processo fabril, com a recuperação da soda e enxofre utilizados nos digestores e geração de energia para uso próprio.

Ainda em meados do século XX, a valorização de terras na área central da cidade, inicialmente leva as classes mais privilegiadas a ocuparem os morros em torno do centro e depois as várzeas não mais inundáveis, após a construção da Represa de Santa Branca em 1960. É quando também começam a surgir os bairros populares distantes do centro. É interessante registrar que, nesse período, a população se habitua a frequentar a Prainha para se refrescar nas águas ainda limpas do Rio Paraíba.

Na década de 1970, a construção das barragens de Paraitinga, Paraibuna e Jaguari modifica ainda mais a dinâmica do Rio Paraíba do Sul. Os reservatórios das usinas hidrelétricas de Paraibuna e Jaguari se tornam os principais reguladores das vazões do rio, propiciando o controle de inundações e a derivação de parte das águas para o Complexo Hidrelétrico de Lajes e abastecimento da Região Metropolitana do Rio de Janeiro.

Alojamento da Barragem do Jaguari, na década de 1970. Arquivo do ex-morador do local, Sr. Mauro Kueka Bueno.


Essas interferências causam sérios impactos ambientais. Um deles é a diminuição do aporte de sedimentos. Segundo Reis (2003), isso força a substituição de extração de areia em leito pelo sistema de cava submersa a partir de 1973. Nessa mesma época é criada a CETESB e implantado o controle ambiental para toda atividade poluidora. A seguir, em 1997, o Instituto Geológico estabelece normas técnicas, procedimentos de licenciamento e o zoneamento ambiental da mineração, com limites de construção para áreas eminentemente arenosas, numa tentativa de inibir os contínuos impactos negativos. Veja mais em História Ambiental do Vale do Paraíba.

Outro importante impacto dos barramentos do fluxo de água diz respeito aos peixes de piracema, quando as fêmeas nadam rio acima para desovar. Para exemplificar, o peixe Salminus maxilosus, popularmente conhecido como “dourado”, precisa nadar cerca de 500 km contra a correnteza, até a exaustão para conseguir chegar ao estágio de reprodução. Ocorre que, geralmente quando esses peixes encontram os barramentos, se lançam contra suas paredes e acabam morrendo, resultando em expressiva diminuição de seu cardume em nossas águas.

A cidade chega ao ano 2000 com mais de 191.000 habitantes. A expansão urbano-industrial, como em todas as outras cidades paulistas do eixo da Rodovia Presidente Dutra, continua causando severos impactos ambientais. Uma vista aérea da cidade hoje, nos mostra muitas várzeas aterradas e ocupações irregulares de áreas ciliares. Muitos bairros - a exemplo do Jardim Flórida, que está numa área onde era uma plantação de arroz - surgem assim. Lá na frente, a planície aluvial vai sendo ocupada por diversas cavas ao longo das margens do Rio Paraíba para atender ao mercado imobiliário com sua produção de areia, como se vê na região do Parque Meia Lua. Os esgotos atingem os canais de drenagem natural das águas pluviais ao longo do trecho urbano, a exemplo do Rio Turi, que necessitou de uma gigantesca obra de saneamento para minimizar os impactos ao meio ambiente.

No primeiro plano, uma das grandes cavas existentes a margem do Rio Paraíba, na região do Distrito do Meia Lua.


Dessa maneira, a cidade segue crescendo. Hoje, Jacareí faz parte do Complexo Metropolitano Expandido, que reúne 75% da população do estado. Com uma taxa de crescimento anual de 1,84%, estima-se que a cidade tenha cerca de 240.000 habitantes. Com um parque industrial com mais de 300 indústrias, e muitas outras chegando, o município é a 28ª economia do estado de São Paulo.

Em meio a todo o processo de contínua expansão econômica da região, fica claro que é de suma importância a preocupação com a conservação e gestão responsável dos recursos naturais que ainda nos restam. Lembrando que a represa do Jaguari, integrante do Sistema Cantareira, irá disponibilizar parte de suas águas como alternativa para subsidiar o abastecimento de 180 municípios da macrometrópole de São Paulo.

Outra importante questão a ser tratada com rigor é a universalização do saneamento básico do município, cujas metas a serem alcançadas ainda irão exigir muito esforço de nossos governantes e concidadãos. Conseguimos um grande avanço com relação ao tratamento dos esgotos domésticos, porém ainda falta atingir a meta planejada. Por outro lado, apesar de termos uma boa prática de gestão de resíduos sólidos, com LEVs, reaproveitamento, aterro sanitário e mais recentemente uma usina de biodigestão, ainda falta a conscientização da população quanto ao manejo correto desses resíduos que normalmente são dispensados em vias públicas, até mesmo ao pé das placas de aviso “Proibido Jogar Lixo ou Entulho – Área Monitorada - Sujeito a Multa”. Isso vem de encontro a outra situação crítica que é o sistema de drenagem da cidade que se entope de lixo, causando transtornos em períodos de chuva nas áreas mais baixas e de escoamento precário.

Entretanto, apesar das muitas dificuldades existentes, sabemos que com determinação e coragem, sempre será possível dar o próximo passo e marcar outros tantos pontos positivos na história de nossa amada Jacareí. Esse momento da história também é nosso e nele devemos concentrar esforços e exercer nossa cidadania para poder seguir firmes em direção ao futuro melhor, mais sustentável, com mais qualidade de vida a todos.

Parabéns Jacareí, pelos seus 366 anos de história!

Autor:
José Leonardo da Silva Cardoso
Diretor Técnico da Biotrakti

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