Em artigo denominado “Controle de
Sólidos em Sistema Aeróbio de Lodo Ativado” abordamos as principais
características básicas do lodo ativado e suas interações com os indicadores de
processo. Nele vimos que a sedimentabilidade e adensabilidade do lodo no
decantador secundário irão depender do desenvolvimento estrutural dos flocos, fator
esse que interfere diretamente na clarificação do efluente final e na
concentração do retorno de lodo.
Sendo assim, os flocos do lodo
ativado poderão se desenvolver de diferentes maneiras; ora com crescimento
disperso ou flocos pequenos e fracos causando muita turbidez no efluente
tratado, ou poderão crescer formando espuma devido a presença de surfactante
não biodegradáveis ou então, sofrer bulking (filamentoso ou não filamentoso) que
irá prejudicar a compactação e a sedimentabilidade da biomassa.
Pois bem! Dentre estes problemas que
ocorrem na separação do lodo ativado, temos o bulking não filamentoso, também
chamado “bulking viscoso”, que definimos como tema a ser explorado neste
artigo.
Conforme relata David Jenkins et al., no “Manual on the Causes and
Control of Activated Sludge Bulking and Foaming”, o bulking viscoso é causado
por uma falha na microestrutura do floco, em que é produzido demasiado material
extracelular que, em situação normal, contribuiria para a biofloculação. Entretanto,
no bulking viscoso os micro-organismos ficam envoltos em grande quantidade de
polímeros extracelulares com alta capacidade de retenção de água, que poderão
conferir uma consistência gelatinosa ao lodo e reduzir sua taxa de compactação
e sedimentação no clarificador secundário.
Como identificar a ocorrência do bulking viscoso?
Ainda segundo Jenkins, esses
polímeros extracelulares contêm polissacarídeos que podem ser identificados e
quantificados como carboidratos através do teste de anthrone, onde os
carboidratos são fervidos na presença de ácido sulfúrico concentrado para
formar furfurais que irão reagir com aminas aromáticas para formar coloração
que podem ser medidas em espectrofotômetros.
O lodo ativado de um tratamento
de efluente industrial normalmente contém de 20 a 22% de carboidratos expressos
como glucose em base seca. Em vários casos de bulking viscoso, o nível de
carboidratos sobe para 70%, apesar das interferências na sedimentação começarem
a aparecer entre 25 e 30% de glucose. Daí a importância em mensurar a glucose.
Outro método de identificação do
excesso de polímeros extracelulares é o exame microscópico do lodo tingido com
uma gota de nanquim. Nesse teste, o entorno e interior do floco envolvido pelo
material extracelular não serão penetrados pela tinta. A observação é feita em
microscópio com contraste de fase e lente de 100X.
Não poderíamos deixar de
registrar que, em laboratório é possível identificar de antemão problemas com a
viscosidade do lodo ativado durante a filtração para análise de SST. A prática
mostra que a colmatação do papel de filtro associada ao não excesso de filamentos
no floco, são fortes indicativos de intumescimento viscoso.
Quais são as causas?
O bulking viscoso costuma ocorrer
em efluentes que contêm excesso da matéria carbonácea facilmente biodegradável
associado a deficiência de nutrientes, conforme Jenkins et al. (1993).
Aparentemente o “limo exocelular” é produto de um crescimento desbalanceado dos
micro-organismos do lodo ativado quando estes não podem produzir material
celular contendo nitrogênio e fósforo devido à falta de nutrientes. Para evitar
problemas, é necessário manter a concentração de ortofosfato solúvel no
efluente entre 1 e 2 mg/L. Também deve-se observar sempre a relação BOD5/N/P
escolhida para operar o sistema de lodo ativado convencional, por exemplo:
100/5/1 normalmente utilizada para efluente doméstico, ou outra taxa como 100/3,5/0,7
muito utilizada pela indústria papeleira. Importante também, é evitar dosagem
excessiva de nitrogênio, porém há muitos outros cuidados que se deve tomar com
a questão dos nutrientes. Veja mais em Nutrientes Químicos Empregados no Tratamento de Efluentes,
de David Charles Meissner.
Outra causa que tem sido
encontrada - em plantas de lodo ativado de efluente doméstico com alta
concentração de MLSS e intensa aeração – são as altas taxas de absorção de
oxigênio dissolvido. Essa alta taxa metabólica provavelmente também leva ao
crescimento desbalanceado devido a impossibilidade de as bactérias obterem
nutrientes tão rápido quanto possam processar a matéria orgânica.
Zoogloea ramigera |
Eikelboom e van Buijsen (1981)
reconhecem o termo “bulking viscoso” como “zoogloeal bulking”, isso porque a
zoogloea ramigera é a mais conhecida produtora de polímeros extracelulares em
efluentes. Ela é uma bactéria formadora de floco tipicamente encontrada em
seletor aeróbio de lodo ativado e tem grande capacidade de sequestrar o
substrato solúvel de rápida biodegradação que, se estiver em excesso juntamente
com baixo fornecimento de nutrientes e baixo pH, poderá causar o bulking
viscoso.
Como controlar?
Primeiramente deverão ser
monitoradas as variações da DBO afluente, SSVTA, idade do lodo, F/M, e OD para
detecção de carga orgânica inadequada. A verificação da taxa de consumo de
oxigênio no tanque de aeração também irá auxiliar na detecção de substâncias
tóxicas.
Logo, se faz ajustes operacionais
como a correção da dosagem de nutrientes para obtenção do residual de N e P desejado,
a manutenção do descarte abaixo de 10% e o aumento temporário da taxa de
retorno para minimizar o arraste de sólidos do decantador. Também será
necessário baixar o nível de OD e continuar monitorando os lançamentos na rede
de efluentes até que o problema esteja resolvido.
Quando os ajustes de processo não
alcançam os resultados desejados, algumas plantas optam pelo uso de polímeros
sintéticos para auxiliar na sedimentação do lodo intumescido pelo material
extracelular retentor de água. O fornecedor geralmente testa diversos tipos e
diferentes dosagens de polímeros e indica o mais adequado, que deverá ser
utilizado sob acompanhamento frequente com jar test para detectar possíveis
necessidades de ajustes da dosagem a fim de evitar excessos e perda do desempenho.
Por ora é o que tínhamos a
apresentar sobre o assunto. Para encerrar esta pauta, vamos desde já deixar
definido que o tema a ser explorado no próximo artigo será o “bulking
filamentoso”, esse grande vilão das ETEs de lodo ativado. O texto se desenvolverá
nos mesmos moldes acima apresentados para facilitar a compreensão. Também é
oportuno dizer que o padrão de duas laudas utilizado para confecção de cada
artigo desta coluna geralmente não é suficiente para abordar completamente o
assunto da postagem, entretanto, acreditamos que o leitor interessado em saber
mais poderá se direcionar melhor a partir de sua leitura.
Obrigado pela atenção e até
breve!
Autor: José Leonardo S. Cardoso
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